quarta-feira, junho 08, 2005

Age of Empires e a minha vida

É estranho estar tanto tempo sem escrever, até porque eu adoro escrever. Ultimamente a minha vida deu numa volta de 1,99*pi radianos! Não sei bem como explicar porque no fundo continua tudo na mesma, mas o ambiente mudou completamente. (Não, não me casei). A verdade é que tenho tido poucas oportunidades para estar ao pé do computador e, quando estou, tenho que fazer tanta coisa que depois fico sem vontade de escrever. Durante o dia tenho tantas ideias e o teclado anda tão longe!

Lembro-me de comparar a vida à construção de puzzles (adoro puzzles). As peças só encaixam de certa maneira, temos que ter muita paciência para descobrir quais encaixam em quais e, comecemos da esquerda ou da direita, acabamos por atingir os nossos objectivos. No entanto (e tendo como mentora a Trinity), a verdade é que prefiro pensar que o final não está previamente escolhido e que as minhas escolham afectam o que eu quero ser (se bem que coisas como envelhecer, aprender a ler e fazer 4ª classe já estavam previstas, por assim dizer). Lembrei-me então de outra analogia: o jogo "Age of Empires"! Não é que ande a caçar veados enquanto espero que chegue a idade do sedentarismo (até porque tenho uma faceta nómada), mas aquela ideia de ter o mundo obscuro até eu avançar e começar a descobrir o mapa está muito bem pensada! O meu conhecimento global está às manchas e cheio de buracos negros porque eu não conheço imensas coisas. A verdade é que quanto mais conheço mais percebo que a parte negra é muito maior do que eu tinha imaginado! (O raio do grego tinha razão). Se eu passasse a minha vida enfiada dentro de uma aldeola e não conhecesse mais nada, provavelmente vivia feliz sem saber de nada que me fizesse sair da minha concha. Ia sentir-me feliz no senso comum do meu dia-a-dia e nunca ia entender a verdadeira extensão da minha ignorância. O problema é apercebermo-nos de como somos ignorantes, conhecer coisas novas que nunca tínhamos sequer imaginado que existiam (isto lembra-me que se vai realizar o primeiro campeonato de futebol para porcos - "pigball"). O meu mundo vai-se desvendando (se bem que a maior parte vai ficar às escuras) e eu vou aprendendo a deslocar-me nele e a tentar aprender mais coisas.

Pensar nisto tudo faz-me sentir estupidamente pequena. Lembro-me de alguém dizer que podíamos aproximar (por excesso) o número de galáxias ao número de grãos de areia que existem em todas as praias da Terra. Se todos esses grãos fossem galáxias, o nosso sistema solar já era estupidamente pequeno, mas a verdade é que a Terra (e nem quero comparar o meu tamanho com o do planeta) seria muito mais pequena do que um micróbio. Será que um micróbio tem esperança de média de vida suficiente para conhecer uma milésima fracção do grão de areia? Penso que é uma visão um bocadinho deprimente, portanto vou-me ficar pela visão do Hobbes: "a ignorância é uma benção!". (O problema é que o bichinho de querer saber sempre mais anda aí.. tan nan nan nan).

quarta-feira, junho 01, 2005

Crianças

"Um escultor manda vir um grande bloco de pedra e deita mãos ao trabalho. Uns meses mais tarde termina a escultura de um cavalo. Uma criança que o esteve a ver trabalhar pergunta-lhe então:
- Como sabias tu que havia um cavalo dentro da pedra?"

Incrível a maneira de pensar das crianças, não é? Tão simples, tão irresistivelmente lógica! São capazes de meter a um lado qualquer cientista de renome com as suas conclusões devastadoramente simples. Normalmente, a solução dos problemas tem tendência a ser algo fácil, como o ovo de Colombo! Arrisco-me a dizer que vêem a vida com olhos saudáveis, nós limitamo-nos a pôr óculos e a distorcer a nossa realidade, ano após ano, enquanto a nossa graduação aumenta. Felizmente, a doença é regressiva com o avançar dos anos, a graduação começa a diminuir e as coisas vão retomando aos seus respectivos lugares: as coisas importantes ficam mais perto e as coisas insignificantes afastam-se para a linha do horizonte (relembro que a linha do horizonte é uma linha imaginária).

Afastei-me um pouco do tema: as crianças. Há aquelas super mimadas, há aquelas super teimosas, há aquelas super chatas, há aquelas que parecem tomadas pelo diabo! No fundo, só há umas que crescem mais depressa do que outras porque, na sua maioria, crescem à imagem e semelhança dos pais. Uma criança não quer ter razão, é essa ingenuidade e humildade que lhes permite dizer o que pensam. Vêem apenas a vida tal como ela é e ainda a têm pintada por todo o carinho que as pessoas lhes dipensam. Abraçam sempre com força, riem com vontade, fazem caretas quando os obrigam a dar um beijinho às tias (eu ainda faço..) e não tentam disfarçar quando estão aborrecidas. Curiosamente, sabem o que está dentro delas e dos outros, podem não adivinhar o que está dentro de um bloco de pedra, mas compreendem o potencial do escultor. Será que nós nos apercebemos do potencial que está dentro de nós? Será que ainda temos e guardamos a "nossa" criança?

É bom "perder" tempo a ouvir e compreender quando uma criança tenta falar connosco. A visão dela é simples e lógica, cheia de imaginação, cheia de falta de razão, mas acima de tudo é uma realidade que também podia ser nossa. Suponho que o ponto fulcral da questão está em querermos ter razão, mesmo que para isso tenhamos que inventar uma coisa ou outra; ter razão faz-nos sentir importantes aos olhos dos outros. Porque é que temos medo de cair no ridículo? Porque é que temos medo de rir com vontade? Porque é que não rebolamos na relva, não andamos a correr à chuva, não fazemos nada das coisas mirabolantes que nos apetecem? Talvez por uma série de razões que acabam por não ter razão!

(O texto que transcrevi no início do post chama-se "Um segredo de escultor" e pode ser encontrado no livro "Tertúlia de Mentirosos" de Jean-Claude Carrière, da editora "teorema")