(continuação)
Uma das primeiras coisas que aprendi sobre estes escaravelhos (e que adorei) é que simbolizavam o deus-sol. Ora o que é que este deus fazia? Entretinha-se a mover o sol no firmamento, o que é extremamente parecido (ou não) com um escaravelho a mover a sua bola de excremento. Sim senhora, temos um escaravelho que gosta de colocar os seus ovos em locais pouco... comuns, vá. Está ligado ao deus-sol, assim como ao renascimento, renovação e ressurreição. A primeira coisa que me ocorreu foi a campanha dos R's para apelar à reciclagem. A minha mente aterrou literalmente no Egipto e o meu pensamento estava todo enrolado em hieróglifos. Via escaravelhos, burros, o Romeu e a sua Julieta a escrever postais, além de uns tantos escaravelhos a sair da fonte da rotunda lá em baixo.
O que me chamou à razão e devolveu à terra com alguma racionalidade foi o meu estômago: comida! Pois sim, já era quase hora de almoço e eu não tinha preparado nada. Apesar de me apetecer fazer qualquer coisa para me distrair, só via escaravelhos à frente portanto decidi ir almoçar fora. O barulho dos carros e das pessoas distraiu-me facilmente das areias e pirâmides egípcias, mas continuava com os escaravelhos à volta. Especialmente depois de ler que um “primo” africano desses escaravelhos podia atingir os 9cm. Isso é quase a minha mão aberta, uma escala no piano! Se um destes me aparecesse à frente, ainda era capaz de esfregar os olhos umas duas vezes para ver se estava a ver bem antes de fugir.
Lá desci a rua alegremente, com a mala a tiracolo e um livro na mão, livro esse cheio de bilhetinhos e um postal. Entrei num restaurante qualquer que me pareceu ter uma lista simpática para sábado e escolhi um lugar virado para a rua. Cada vez que saio de casa é para ir para longe, até me esqueço de sair e passear nas redondezas. O facto de estar ali sentada a olhar para a minha rua de sempre causava-me um certo bem estar pela noção de familiaridade. Suponho que as surpresas já estavam em grande número só para um dia e permiti-me a um certo relaxamento. Olhei em volta para chamar um empregado e reparei que alguém tinha deixado um daqueles jornais grátis que distribuem no metro em cima de uma cadeira. Resolvi folheá-lo só para passar o tempo. De repente voltei a sentir-me estúpida, mas desta vez era uma mistura de estupidez e ignorância pura.
Num dos cantos reservados à publicidade, lá estava um aviso sobre uma exposição egípcia com algumas coisas trazidas de outros museus europeus. Uma exposição egípcia ali na minha “terra” e eu não tinha dado por nada?! Tenho mesmo que prestar mais atenção ao sítio onde vivo. Confesso que fiquei altamente envergonhada e, apesar de não saber quem estava por trás das pistas, desejei secretamente que não se tivesse apercebido daquela minha falha. Soava-me a coisa grave, afinal, eu nunca fui uma grande fã de História, mas a coisa mudava de figura quando o Egipto, a Suméria ou a Grécia entravam em cena (não por esta ordem, claro). O almoço chegou finalmente... tentei comer devagar, mas a excitação e curiosidade cresciam tanto dentro de mim que me vi no metro enquanto o diabo esfrega o olho. A viagem ainda demorou um bocado, mas quando saí da estação e olhei os grandes cartazes com escaravelhos na parede do museu, senti o dever cumprido. Mesmo que não descobrisse a sétima pista, tinha chegado à sexta e isso tudo numa manhã de sábado era de louvar.
sexta-feira, agosto 31, 2007
sexta-feira, agosto 24, 2007
Quarta pista: recordar é viver
(continuação)
Uma vez fora da loja, encostei-me a um canto do passeio e abri o telemóvel para ver a MMS. Era novamente de ninguém (por assim dizer) e demorei um bocado a perceber o que era a imagem. Ao fim de olhar para a imagem umas tantas vezes, reenviei-a para um amigo meu especializado no assunto com o seguinte texto: “Isto é o dartacão, não é?!”. Só não levantei o sobrolho enquanto reconhecia a imagem porque não consigo fazer isso só com uma sobrancelha. Mas continuo a achar que dá estilo conseguir e é útil, em situações como esta, por exemplo. A resposta foi mais rápida do que eu esperava: “Yeah, mas porque é que queres saber?”. Se eu soubesse a resposta... Pelo menos tinha a certeza do que os meus olhos viam e o meu cérebro não queria acreditar: o dartacão era a minha quarta pista. Sim senhor, mais estranho começava a ser difícil.
Voltei para casa e usei essa bela ferramenta que dá pelo nome de “You Tube”. Confesso que me agradou rever o genérico dos desenhos animados. Reparei também numa mensagem simpática que aparecia e que eu nunca tinha dado conta, qualquer coisa como “esta série baseada na história de Alexandre Dumas pretende enaltecer duas virtudes que nunca devem ser esquecidas: honra e amizade”. Catita, sim senhor! Ora Alexandre Dumas (pai)... eu tinha a certeza que dele só tinha o “O conde de Monte Cristo”, portanto a pista não devia ser por ali. Estava a começar a ficar com umas ideias muito retorcidas e já achava que a pista tanto podia estar no meu cão (que não tem muito de mosqueteiro, nem de moscãoteiro, já agora), como no facto da cadela se chamar exactamente Julieta e estar ligada ao livro “Romeu e Julieta”. Pelo sim, pelo não, saí e fui até ao jardim. Chamei o meu cão, brinquei com ele e examinei-lhe a coleira com cuidado, apesar dele não estar a achar muita piada ao facto. Deixei-me estar a brincar um bocadito mais com ele, só para ter a certeza que não o ia levar ao veterinário e que ele escusava de fugir.
Segunda ideia mirabolante: Shakespeare. Esta ideia ainda era pior do que a outra porque, novamente, eu tinha o livro errado. Li vezes sem conta o “Sonho de uma noite de Verão”, mas não metia o dartacão (só um homem transformado em burro) nem a Julieta. No final, decidi abrir também o exemplar de “O conde de Monte Cristo”, mas não tinha lá nada que me ajudasse sem ser a história (belíssima por sinal, a personagem da “escrava” Haydée seduziu-me por completo). Perdi-me um bocado a relembrar estas histórias e a pensar em como o ódio pode ser quase tão bom como o amor no que toca à sobrevivência. Entretida pela redescoberta destas “grandes” histórias perdidas na minha memória, percorri as várias prateleiras de livros que tenho quarto. Muitos livros de Júlio Verne, um dos meus autores favoritos. E eis que no final da prateleira mais alta estava um exemplar dos três mosqueteiros de Alexandre Dumas, bem arrumado e mais perto da minha testa do que dos olhos, parecia ter estado sempre ali.
Abri o livro, virei-o do avesso e abanei-o vigorosamente. Caiu um pequeno rectângulo de papel branco. Estava manuscrito com letras maiúsculas: “NUNCA LI O LIVRO, MAS DIZEM QUE É BOM. ATÉ GOSTEI DO FILME. NEM ACREDITO QUE NÃO O TINHAS! SÓ ME DÁS TRABALHO! JÁ AGORA, PODES FICAR COM ESTE” Virei o papel ao contrário e tinha um escaravelho egípcio impresso, daquele tipo dos que vemos nos filmes a “comer” pessoas, como na “Múmia”.
Uma vez fora da loja, encostei-me a um canto do passeio e abri o telemóvel para ver a MMS. Era novamente de ninguém (por assim dizer) e demorei um bocado a perceber o que era a imagem. Ao fim de olhar para a imagem umas tantas vezes, reenviei-a para um amigo meu especializado no assunto com o seguinte texto: “Isto é o dartacão, não é?!”. Só não levantei o sobrolho enquanto reconhecia a imagem porque não consigo fazer isso só com uma sobrancelha. Mas continuo a achar que dá estilo conseguir e é útil, em situações como esta, por exemplo. A resposta foi mais rápida do que eu esperava: “Yeah, mas porque é que queres saber?”. Se eu soubesse a resposta... Pelo menos tinha a certeza do que os meus olhos viam e o meu cérebro não queria acreditar: o dartacão era a minha quarta pista. Sim senhor, mais estranho começava a ser difícil.
Voltei para casa e usei essa bela ferramenta que dá pelo nome de “You Tube”. Confesso que me agradou rever o genérico dos desenhos animados. Reparei também numa mensagem simpática que aparecia e que eu nunca tinha dado conta, qualquer coisa como “esta série baseada na história de Alexandre Dumas pretende enaltecer duas virtudes que nunca devem ser esquecidas: honra e amizade”. Catita, sim senhor! Ora Alexandre Dumas (pai)... eu tinha a certeza que dele só tinha o “O conde de Monte Cristo”, portanto a pista não devia ser por ali. Estava a começar a ficar com umas ideias muito retorcidas e já achava que a pista tanto podia estar no meu cão (que não tem muito de mosqueteiro, nem de moscãoteiro, já agora), como no facto da cadela se chamar exactamente Julieta e estar ligada ao livro “Romeu e Julieta”. Pelo sim, pelo não, saí e fui até ao jardim. Chamei o meu cão, brinquei com ele e examinei-lhe a coleira com cuidado, apesar dele não estar a achar muita piada ao facto. Deixei-me estar a brincar um bocadito mais com ele, só para ter a certeza que não o ia levar ao veterinário e que ele escusava de fugir.
Segunda ideia mirabolante: Shakespeare. Esta ideia ainda era pior do que a outra porque, novamente, eu tinha o livro errado. Li vezes sem conta o “Sonho de uma noite de Verão”, mas não metia o dartacão (só um homem transformado em burro) nem a Julieta. No final, decidi abrir também o exemplar de “O conde de Monte Cristo”, mas não tinha lá nada que me ajudasse sem ser a história (belíssima por sinal, a personagem da “escrava” Haydée seduziu-me por completo). Perdi-me um bocado a relembrar estas histórias e a pensar em como o ódio pode ser quase tão bom como o amor no que toca à sobrevivência. Entretida pela redescoberta destas “grandes” histórias perdidas na minha memória, percorri as várias prateleiras de livros que tenho quarto. Muitos livros de Júlio Verne, um dos meus autores favoritos. E eis que no final da prateleira mais alta estava um exemplar dos três mosqueteiros de Alexandre Dumas, bem arrumado e mais perto da minha testa do que dos olhos, parecia ter estado sempre ali.
Abri o livro, virei-o do avesso e abanei-o vigorosamente. Caiu um pequeno rectângulo de papel branco. Estava manuscrito com letras maiúsculas: “NUNCA LI O LIVRO, MAS DIZEM QUE É BOM. ATÉ GOSTEI DO FILME. NEM ACREDITO QUE NÃO O TINHAS! SÓ ME DÁS TRABALHO! JÁ AGORA, PODES FICAR COM ESTE” Virei o papel ao contrário e tinha um escaravelho egípcio impresso, daquele tipo dos que vemos nos filmes a “comer” pessoas, como na “Múmia”.
sexta-feira, agosto 10, 2007
Terceira pista: usar a realidade
(continuação)
Liguei o computador novamente, mas desta vez fui direitinha ao mail. Lembrei-me da última pesquisa no google e como podia ter visto o mail mais cedo. É certo que agora não podia fazer nada, mas não conseguir evitar a sensação de que podia ter chegado ali mais depressa. O triste de ter mais de uma conta para estas coisas é que nunca sabemos exactamente quem usa qual. Abri todas e fiquei ansiosamente à espera de um mail sem “viagra” no cabeçalho. Antes de desanimar por completo, li o SPAM de alto a baixo. Efectivamente o filtro fez uma boa separação (não pode correr sempre mal). Estava desolada, ou não tinha percebido qual mail era o certo, ou realmente a pista não apontava para ali. Ora bem, já que estávamos em Portugal, dirigi-me ao correio em cima da mesa da entrada. Vasculhei as contas todas e não encontrei nada digno de registo. Lá me calcei e desci até à caixa de correio. Finalmente qualquer coisa! Um postal ilustrado sem selo. Pareceu-me bem, soava a pista. Não tinha nome, mas tinha uma rua.
Sentei-me ao computador (novamente), procurei onde é que a rua ficava e não fui lá muito bem sucedida. Procurei nos mais variados sítios e nada, a rua não existia e se existisse não era neste país, o que não me ajudava em nada de qualquer modo. Ocorreu-me subitamente que mais importante do que saber o que se escondia no postal era mesmo tomar o pequeno-almoço. Saí de casa, mas só depois de inspeccionar rapidamente todas as divisões em matéria de candeeiros ou coisas estranhas deixadas nos móveis. Nada... decidi então dar toda a minha atenção a um croissant de chocolate na pastelaria no final da rua. Quando acabei, tirei o postal da mala e fiquei a olhar para ele. Não tinha selo, não tinha nome, não tinha mensagem, só aquela rua “desaparecida”.
Apesar de tudo, tinha um forte pressentimento dentro de mim. Saí da pastelaria, percorri as ruas banhadas com o sol fraco das dez da manhã (vista rara para mim) e entrei num supermercado mais escondido, mais calmo. Não saía de casa com vontade de ver nada há alguns dias, achei que a dor estava a passar, mas pelas razões erradas. Não entanto, não evitei um leve sorriso quando vi que ainda havia uma caixa, comprei-a, escondi-a dentro da minha mala e esperei que o meu sexto sentido, tão poucas vezes usado, estivesse certo. Se calhar era só uma dose gigantesca de esperança seguida de um grande balde de água fria. Tentei não pensar que estava certa, era melhor esperar para ver. Mas a luzinha cá dentro recusou-se a apagar, o que me obrigou a escondê-la o melhor possível para não pensar nela. Nestas voltas onde brigava com o meu próprio pensamento, dei por mim na rotunda mais bonita e mais movimentada ali do sítio. Parei por momentos a olhar para a estátua a jorrar água, impassível no meio de tanto carro e senti-me mesmo estúpida.
Estúpida por duas razões (e haviam mais de certeza, mas pronto), primeiro porque tinha parado de repente no meio do passeio e levei com uma gorda qualquer, em segundo porque aquela rotunda era a imagem do postal! Incrível como não ligamos às coisas perto de casa, bem que a imagem do postal me parecia familiar mas, pronto, fontes em rotundas é o que não falta nas capitais europeias. Senti um nervoso miudinho a correr o meu corpo porque não sabia o que fazer a seguir. Resolvi rodear a rotunda a pé, podia ser que me estivesse a escapar algo. Quando dei precisamente metade da volta, olhei para o sítio de onde tinha saído e vi um pequeno quiosque com alguns postais num mostrador exterior. Disse algumas asneiras entre dentes e voltei ao sítio de onde tinha saído. Vi imensos postais iguais ao meu enquanto entrava na loja. Eu levava o postal na mão e a moça que estava a atender reparou nele. Riu-se e só me disse:
- Não estava à espera que chegasse cá tão cedo!
- Estava à minha espera?!
Não me respondeu, mas riu-se e achei que a minha pergunta era retórica de qualquer modo. Ela pegou num telemóvel, pediu-me para esperar e, pouco depois, foi a vez do meu telemóvel tocar. Ri-me desconfortavelmente e suponho que tinha um ar de quem não controla nada do que se está a passar, um bocadito miserável porque comecei a duvidar se conseguia chegar ao fim.
- Não fique assim! Vai ver que é uma boa surpresa!
E piscou-me o olho. Eu acreditei. Acreditei numa pessoa que eu nunca tinha visto na minha vida. Acreditei porque obviamente ela fazia parte do jogo e eu não tinha como duvidar. Fiquei com a ideia que Lisboa inteira sabia o que eu não sabia. O que estava no final das sete pistas. Lembrei-me do pote de ouro no final do arco-íris... que também tem sete cores. Desejei que não fosse ouro, de qualquer modo. Respirei fundo e ainda perguntei, antes de olhar para a MMS que tinha acabado de chegar:
- Não me vai ajudar a decifrar, pois não?
- Não, até porque não sei o que é. Mas mesmo que soubesse, acho que prefere chegar lá sozinha!
Se calhar nem preferia, mas pronto, não tinha hipótese. Agradeci e comprei uns rebuçados só para não parecer muito mal-educada. Estava um bocado atordoada.
Liguei o computador novamente, mas desta vez fui direitinha ao mail. Lembrei-me da última pesquisa no google e como podia ter visto o mail mais cedo. É certo que agora não podia fazer nada, mas não conseguir evitar a sensação de que podia ter chegado ali mais depressa. O triste de ter mais de uma conta para estas coisas é que nunca sabemos exactamente quem usa qual. Abri todas e fiquei ansiosamente à espera de um mail sem “viagra” no cabeçalho. Antes de desanimar por completo, li o SPAM de alto a baixo. Efectivamente o filtro fez uma boa separação (não pode correr sempre mal). Estava desolada, ou não tinha percebido qual mail era o certo, ou realmente a pista não apontava para ali. Ora bem, já que estávamos em Portugal, dirigi-me ao correio em cima da mesa da entrada. Vasculhei as contas todas e não encontrei nada digno de registo. Lá me calcei e desci até à caixa de correio. Finalmente qualquer coisa! Um postal ilustrado sem selo. Pareceu-me bem, soava a pista. Não tinha nome, mas tinha uma rua.
Sentei-me ao computador (novamente), procurei onde é que a rua ficava e não fui lá muito bem sucedida. Procurei nos mais variados sítios e nada, a rua não existia e se existisse não era neste país, o que não me ajudava em nada de qualquer modo. Ocorreu-me subitamente que mais importante do que saber o que se escondia no postal era mesmo tomar o pequeno-almoço. Saí de casa, mas só depois de inspeccionar rapidamente todas as divisões em matéria de candeeiros ou coisas estranhas deixadas nos móveis. Nada... decidi então dar toda a minha atenção a um croissant de chocolate na pastelaria no final da rua. Quando acabei, tirei o postal da mala e fiquei a olhar para ele. Não tinha selo, não tinha nome, não tinha mensagem, só aquela rua “desaparecida”.
Apesar de tudo, tinha um forte pressentimento dentro de mim. Saí da pastelaria, percorri as ruas banhadas com o sol fraco das dez da manhã (vista rara para mim) e entrei num supermercado mais escondido, mais calmo. Não saía de casa com vontade de ver nada há alguns dias, achei que a dor estava a passar, mas pelas razões erradas. Não entanto, não evitei um leve sorriso quando vi que ainda havia uma caixa, comprei-a, escondi-a dentro da minha mala e esperei que o meu sexto sentido, tão poucas vezes usado, estivesse certo. Se calhar era só uma dose gigantesca de esperança seguida de um grande balde de água fria. Tentei não pensar que estava certa, era melhor esperar para ver. Mas a luzinha cá dentro recusou-se a apagar, o que me obrigou a escondê-la o melhor possível para não pensar nela. Nestas voltas onde brigava com o meu próprio pensamento, dei por mim na rotunda mais bonita e mais movimentada ali do sítio. Parei por momentos a olhar para a estátua a jorrar água, impassível no meio de tanto carro e senti-me mesmo estúpida.
Estúpida por duas razões (e haviam mais de certeza, mas pronto), primeiro porque tinha parado de repente no meio do passeio e levei com uma gorda qualquer, em segundo porque aquela rotunda era a imagem do postal! Incrível como não ligamos às coisas perto de casa, bem que a imagem do postal me parecia familiar mas, pronto, fontes em rotundas é o que não falta nas capitais europeias. Senti um nervoso miudinho a correr o meu corpo porque não sabia o que fazer a seguir. Resolvi rodear a rotunda a pé, podia ser que me estivesse a escapar algo. Quando dei precisamente metade da volta, olhei para o sítio de onde tinha saído e vi um pequeno quiosque com alguns postais num mostrador exterior. Disse algumas asneiras entre dentes e voltei ao sítio de onde tinha saído. Vi imensos postais iguais ao meu enquanto entrava na loja. Eu levava o postal na mão e a moça que estava a atender reparou nele. Riu-se e só me disse:
- Não estava à espera que chegasse cá tão cedo!
- Estava à minha espera?!
Não me respondeu, mas riu-se e achei que a minha pergunta era retórica de qualquer modo. Ela pegou num telemóvel, pediu-me para esperar e, pouco depois, foi a vez do meu telemóvel tocar. Ri-me desconfortavelmente e suponho que tinha um ar de quem não controla nada do que se está a passar, um bocadito miserável porque comecei a duvidar se conseguia chegar ao fim.
- Não fique assim! Vai ver que é uma boa surpresa!
E piscou-me o olho. Eu acreditei. Acreditei numa pessoa que eu nunca tinha visto na minha vida. Acreditei porque obviamente ela fazia parte do jogo e eu não tinha como duvidar. Fiquei com a ideia que Lisboa inteira sabia o que eu não sabia. O que estava no final das sete pistas. Lembrei-me do pote de ouro no final do arco-íris... que também tem sete cores. Desejei que não fosse ouro, de qualquer modo. Respirei fundo e ainda perguntei, antes de olhar para a MMS que tinha acabado de chegar:
- Não me vai ajudar a decifrar, pois não?
- Não, até porque não sei o que é. Mas mesmo que soubesse, acho que prefere chegar lá sozinha!
Se calhar nem preferia, mas pronto, não tinha hipótese. Agradeci e comprei uns rebuçados só para não parecer muito mal-educada. Estava um bocado atordoada.
sexta-feira, agosto 03, 2007
Segunda pista: não desmoralizar
(continuação)
Enquanto vasculhava as gavetas todas da minha cómoda, pensava como raio não me tinha apercebido que o baton era importante assim que vi a seta marcada na minha pele. Eu não uso baton, portanto foi trazido por alguém e deve estar algures no meu quarto... desejei intimamente que estivesse naquela cómoda porque a minha maior qualidade não é a arrumação, definitivamente. Chateei-me um bocado, tirei as gavetas e virei-as todas do avesso. Mas nada de baton. Senti-me um bocadito frustrada, a descoberta da primeira e ousada pista tinha despertado ainda mais a minha curiosidade. Sem ligar ao cabelo molhado, estendi-me no chão com a máquina fotográfica (porque a cama estava cheia da tralha das gavetas) e passei as fotografias das minhas costas. Ao fim de uns dez minutos, o sorriso no final da frase já me parecia um completo gozo à minha incapacidade de entender o que estava escondido na frase. Por fim desisti e posei a máquina ao meu lado, fechei os olhos e tentei distanciar-me das últimas ideias mirabolantes (porque, pelo menos, tinha a certeza que a Praça Vermelha e o Kremlin não tinham nada a ver com isto). Quando tirei as mãos da cara, posso dizer que passei a ter uma outra perspectiva do meu quarto: o tecto. E lá estava o baton preso ao candeeiro, oscilava perigosamente pendurado apenas por uma ponta de fita-cola. Pergunto-me se não terei dado sinais de que estava a despertar para aquilo ter ficado colado daquela maneira. Agora a única coisa que se metia entre mim e o candeeiro era a minha altura, mas nada que uma cadeira não resolvesse (sim, porque aquilo aos saltos não foi lá). Finalmente agarrei o baton e fiquei a pensar que se fosse um episódio do CSI, tinha posto umas luvas e tirado uma impressão de uns milímetros de dedo, mas que mesmo assim dava para encontrar o responsável pelo jogo em menos de cinco minutos.
Olhei para o baton, não percebia nada daquilo, mas duvidava que fosse coisa de qualidade... aposto que foi comprado numa loja em bico! Depois de muitas voltas ao baton, não descobri grande coisa, mas era óbvio que era ali que estava a minha segunda pista... afinal, os batons não se penduram nos candeeiros porque gostam de praticar queda livre. Resolvi secar o cabelo e deixei o baton à minha frente, talvez esperançada nalguma espécie de telepatia. Depois de vestida e perfeitamente acordada (ou seja, já tinha desistido de comunicar mentalmente com o objecto), tentei desenroscar o baton, mas só consegui sujar as mãos. Lá fiquei eu frustrada a olhar para a peça e resolvi usar a única ferramenta que sabe tudo: o google! Lá procurei por entre dezenas de imagens alguma coisa parecida com aquela e fiquei a achar que era tudo muito igual. Decidi então procurar a referência da cor, podia ser que ajudasse nalguma coisa. Passados menos de cinco minutos, achei que sofria de daltonismo e desliguei o computador. Um bocado chateada, atirei o baton para cima da cama e nesse preciso momento lembrei-me da fita-cola, ainda presa ao candeeiro (tal como eu disse, o meu forte não é a arrumação). Será que a pista estava na fita-cola?! Lá fui outra vez cheia de esperança, bati na cómoda porque saí a correr do quarto, mas nem senti nada tal era a excitação quando cheguei à secretária.
Enrolado na parte de dentro do rolo da fita-cola estava um papelito colado também com fita-cola. Tirei-o com cuidado para não rasgar nada e li em voz alta:
Muito bem! Espero que o candeeiro ainda esteja colado ao tecto (estupor, pensei eu) E agora suponho que estás por tua conta!
Achei que esta pista era finalmente fácil...
Enquanto vasculhava as gavetas todas da minha cómoda, pensava como raio não me tinha apercebido que o baton era importante assim que vi a seta marcada na minha pele. Eu não uso baton, portanto foi trazido por alguém e deve estar algures no meu quarto... desejei intimamente que estivesse naquela cómoda porque a minha maior qualidade não é a arrumação, definitivamente. Chateei-me um bocado, tirei as gavetas e virei-as todas do avesso. Mas nada de baton. Senti-me um bocadito frustrada, a descoberta da primeira e ousada pista tinha despertado ainda mais a minha curiosidade. Sem ligar ao cabelo molhado, estendi-me no chão com a máquina fotográfica (porque a cama estava cheia da tralha das gavetas) e passei as fotografias das minhas costas. Ao fim de uns dez minutos, o sorriso no final da frase já me parecia um completo gozo à minha incapacidade de entender o que estava escondido na frase. Por fim desisti e posei a máquina ao meu lado, fechei os olhos e tentei distanciar-me das últimas ideias mirabolantes (porque, pelo menos, tinha a certeza que a Praça Vermelha e o Kremlin não tinham nada a ver com isto). Quando tirei as mãos da cara, posso dizer que passei a ter uma outra perspectiva do meu quarto: o tecto. E lá estava o baton preso ao candeeiro, oscilava perigosamente pendurado apenas por uma ponta de fita-cola. Pergunto-me se não terei dado sinais de que estava a despertar para aquilo ter ficado colado daquela maneira. Agora a única coisa que se metia entre mim e o candeeiro era a minha altura, mas nada que uma cadeira não resolvesse (sim, porque aquilo aos saltos não foi lá). Finalmente agarrei o baton e fiquei a pensar que se fosse um episódio do CSI, tinha posto umas luvas e tirado uma impressão de uns milímetros de dedo, mas que mesmo assim dava para encontrar o responsável pelo jogo em menos de cinco minutos.
Olhei para o baton, não percebia nada daquilo, mas duvidava que fosse coisa de qualidade... aposto que foi comprado numa loja em bico! Depois de muitas voltas ao baton, não descobri grande coisa, mas era óbvio que era ali que estava a minha segunda pista... afinal, os batons não se penduram nos candeeiros porque gostam de praticar queda livre. Resolvi secar o cabelo e deixei o baton à minha frente, talvez esperançada nalguma espécie de telepatia. Depois de vestida e perfeitamente acordada (ou seja, já tinha desistido de comunicar mentalmente com o objecto), tentei desenroscar o baton, mas só consegui sujar as mãos. Lá fiquei eu frustrada a olhar para a peça e resolvi usar a única ferramenta que sabe tudo: o google! Lá procurei por entre dezenas de imagens alguma coisa parecida com aquela e fiquei a achar que era tudo muito igual. Decidi então procurar a referência da cor, podia ser que ajudasse nalguma coisa. Passados menos de cinco minutos, achei que sofria de daltonismo e desliguei o computador. Um bocado chateada, atirei o baton para cima da cama e nesse preciso momento lembrei-me da fita-cola, ainda presa ao candeeiro (tal como eu disse, o meu forte não é a arrumação). Será que a pista estava na fita-cola?! Lá fui outra vez cheia de esperança, bati na cómoda porque saí a correr do quarto, mas nem senti nada tal era a excitação quando cheguei à secretária.
Enrolado na parte de dentro do rolo da fita-cola estava um papelito colado também com fita-cola. Tirei-o com cuidado para não rasgar nada e li em voz alta:
Muito bem! Espero que o candeeiro ainda esteja colado ao tecto (estupor, pensei eu) E agora suponho que estás por tua conta!
Achei que esta pista era finalmente fácil...
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