quinta-feira, maio 13, 2010

IV: O Tecto

Estava deitada na cama de olhos fechados a tentar processar a informação e a tentar arranjar alguma explicação lógica para as perguntas que me assaltavam. Estremeci quando ouvi a porta da rua a fechar-se, o Miguel tinha saído. Provavelmente para comprar roupa nova... será que ia voltar? De algum modo sentia-me hipócrita por ter vontade que ele voltasse, tentei canalizar essa esperança surgida do nada para a necessidade de apoio, agora que me sentia fragilizada dentro da minha própria casa.

- Não consigo entrar no andar da frente, o raio da porta não mexe um milímetro!!

Sobressaltada, sentei-me na cama com um pulo e abri muito os olhos quando vi o Miguel à porta do meu quarto. Falei rapidamente, para disfarçar o espanto:

- Pensava que tinhas saído para comprar roupa nova?...
- E hei-de sair para comprar roupa nova! Mas faço questão que venhas comigo porque quero que passes pela vergonha de ser vista ao meu lado, enquanto estou vestido para o Carnaval do ano em que foi aberto o Passeio Público em Lisboa. Além disso, não quero que adormeças, isso não é perigoso quando se bate com a cabeça?...
- Obrigada pela preocupação!

E senti um sorriso tão grande a chegar aos meus lábios que tive que voltar a fechar os olhos e concentrar-me para ele não ver. Mas depressa percebi que ele não estava a olhar para mim sequer.

- Pintaste o tecto recentemente?...

Abri os olhos antes de responder e fitei-o. Segui a direcção dos olhos dele até à parte do tecto que estava por cima da cama, exactamente por cima de onde eu estava deitada. De facto, o tecto tinha sido pintado, o branco era definitivamente mais “lavado” por cima de mim. Sentei-me mais direita na cama e observei o Miguel a tentar chegar lá acima com a ajuda de uma cadeira.

- Sabes, eu tenho um escadote cá em casa....
- Deixa, eu acho que consigo chegar lá.
- Eu acho que consegues cair ou partir a cadeira... E nenhuma delas me agrada.
- Estás a chamar-me de gordo?!

Nem sei se cheguei a completar a frase de resposta no meu subconsciente porque ouvi o inevitável “crac” da cadeira a partir-se quando o Miguel saltou. Numa tentativa de ajudá-lo, acabei por ficar debaixo de parte da cadeira. O que até não era muito mau, não fosse ter levado com o Miguel que caiu desamparado em cima da cadeira em cima de mim. Soltei um esgar de dor porque não tinha ar para emitir qualquer outro som; não apenas pelo peso dele em cima de mim, mas também porque uma farpa de madeira entrou algures na minha barriga nesse momento... Não sei bem quando é que começaram a cair tábuas do tecto, mas desconfio que foram uns segundos depois do Miguel ter aterrado em cima de mim e do resto da imagem ter-se apagado com pontos desfocados que se juntaram numa enorme tela preta.

2 comentários:

  1. Já estou aqui com conjecturas acerca desse tecto!

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  2. Espero que a minha falta de coordenação mental não estrague nada no fim!... lol

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